Por Sistema Fecomércio


Em conversa com Márcia Travessoni, Luiz Gastão Bittencourt relembrou sua trajetória diante do Sistema Fecomércio-CE — Foto: YouTube/Reprodução

Após quase duas décadas à frente da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Ceará, do Sesc, do Senac e IPDC, Luiz Gastão Bittencourt tornou-se sinônimo de inovação e transformação nas instituições que formam o Sistema Fecomércio. Para relembrar sua trajetória, o atual vice-presidente administrativo da Confederação Nacional do Comércio conversou com Márcia Travessoni. Leia a seguir alguns trechos da entrevista:

E, primeiro de tudo, a gente, falando de Fecomércio Ceará, que tem um legado de 70 anos... Mas você, na sua gestão, mais ou menos uns 20 anos que você ficou à frente da Fecomércio Ceará, eu queria que você me dissesse o cenário, 20 anos atrás, como era? Como você entrou? O que você encontrou? Eu gostaria que você me contextualizasse sobre esse cenário de 20 anos atrás, é possível?

Luiz Gastão Bittencourt: O cenário era bem diferente do que existe hoje, graças a Deus! O primeiro grande desafio é porque nós tínhamos duas federações do estado do Ceará, e por conta dessas duas federações, nós tínhamos também a administração do Sesc e do Senac completamente díspares, um andava por um lado e outro andava para o outro, chegando a momentos de que funcionários do Sesc não entravam no Senac e funcionários do Senac não entravam dentro do Sesc. Então, não existia uma complementariedade dessas ações, eram ações muito distintas. Existia quase que uma disputa muito ferrenha entre uma instituição e outra, como se não pertencessem ao mesmo grupo, ao mesmo ao mesmo sistema. E, em 2001, nós fizemos a eleição e iniciamos o Sistema Fecomércio. Então nós pegamos, de 98 a 2001, foi um período de conhecimento da casa, de aprendizagem e de vista com relação as estas ações. E se, essas instituições não se falavam entre si, pouco se conversava também com a sociedade. Tinha serviços fantásticos, uma equipe técnica muito boa, mas com os programas voltados muito para dentro de casa e para aqueles comerciários que frequentavam. Então, nós vimos que nós tínhamos um atendimento muito baixo, tanto na formação profissional, a um universo maior, como com relação aos serviços de esporte, cultura e lazer para a sociedade como um todo. Você tinha as suas unidades e se fechava ali. Foi quando nós iniciamos um evento, que era a Mostra de Teatro do Crato, e eu peguei o gancho daquela mostra de teatro, que foi feita durante uns quatro dias no Crato. Na abertura, era tudo fechado na unidade, apertado, quase não conseguia falar, de tanta gente na porta da garagem da unidade. E durante quatro dias, a unidade ficava fechada, ela parava as suas outras atividades e em todos os recantos da unidade do Crato você tinha espetáculos teatrais. Eu chamei a equipe e falei: olha, está na hora de nós sairmos dos nossos muros e fazermos aberturas dessas em praças públicas, interagirmos com a sociedade. E foi aí que iniciou, depois, a Mostra Cariri, e a Mostra Cariri, eu diria que ela tem um pouco dessa abertura que se deu no Sistema Fecomércio.

Ela representa esse início de transformação..

Luiz Gastão Bittencourt: Esse início de transformação e esse novo modelo de enxergar a instituição e se enxergar dentro disso tudo. Depois você teve a iniciação da parte da assistência, de entender que não era só aos comerciários que nós teríamos que servir. Preferencialmente sim, aos comerciários, mas a assistência tinha que ser mais ampla e estar mais presente em outras ações. Então nós passamos a iniciar o Amigos do Prato, o Sesc lançou depois o Mesa Brasil, nós nos incorporamos ao projeto nacional e passamos, através do Mesa, a criar uma grande rede de associações que são beneficiadas e que prestam serviços relevantes para a sociedade também, e, junto com isso, também criar um outro senso de dar educação no manuseio de alimentos para isso. O Senac, ele também tinha muitos cursos de pouca duração e, eu diria, de baixa complexidade e a assimilação no mercado de trabalho. Então nós começamos a quebrar esse ciclo e passar a nos relacionar direto com os empresários e com as empresas, sabendo sim, aonde as empresas tinham dificuldade de colocação da sua mão de obra, qual era o tipo de mão de obra que as empresas estavam precisando e começamos a redirecionar o portfólio de cursos do Senac, e começamos a ver também que o aluno precisava e não poderia ir ao Senac, e exclusivamente, fazer um curso e depois ir embora.

E aí surgiu o banco de oportunidades, é isso?

Luiz Gastão Bittencourt: Surgiu o banco de oportunidades, nós começamos a cadastrar esses alunos e acompanhar a vida do aluno, então nós criamos os Itinerários Formativos, onde você cria núcleos em que você dá a consciência cidadã, do meio ambiente, de postura e até de comportamento, para você ir para uma entrevista, para a criação de empregos... E depois você vai para os blocos mais específicos, criando eixos tecnológicos. Essa metodologia foi aprimorada pelo Nacional, e hoje o Senac do Brasil inteiro trabalha com os Itinerários Formativos, e com 8, 9 eixos de curso de formação profissional. Então você pode começar na moda, então você pode começar com curso de corte de cabelo e você pode fazer um curso de tintura de cabelo, até se formar como cabeleireiro como um todo. Mas você não precisa se formar para ingressar no mercado de trabalho e começar a ter uma renda. Da mesma forma, você pode começar como camareira e chegar a gerente. E também na área de moda, que você conhece bem, trazendo não só cursos, mas pós-graduação em Moda e uma série de outros cursos de design, fazendo com que o Senac pudesse estar presente dentro dessa grande cadeia produtiva do estado, auxiliando essa cadeia e descobrindo novos talentos.

Eu acho que é um bom exemplo que a gente tem recente foi o David Lee, que saiu do curso de design de moda do Senac e, este ano, esteve em Londres, com todo apoio e suporte nessa missão em Londres, e foi uma revelação internacional inclusive, né? Pela crítica inglesa, internacional e francesa também.

Luiz Gastão Bittencourt: Eu tive o prazer de poder estar lá e poder vivenciar e ver, não só a repercussão, mas o respeito de toda a comunidade da moda com o trabalho apresentado por ele. E eu diria, não chegamos numa posição melhor ainda, ele talvez não tenha ganho porque foi a primeira vez que o Brasil participou desse evento, e que o SENAC participou desse evento. E nós entendemos que, além do trabalho da moda, existiu um trabalho também de conscientização ambiental, de países, de posições e, esse trabalho, nós ainda estávamos engatinhando e talvez não estivesse... Talvez não, não estivéssemos preparados para dar esse suporte a ele, mas eu diria que, como estilista, ele foi campeão.

Gastão, às vezes eu percebo que esses resultados, essas vidas que se transformam, em que passam por um Sesc, por um Senac, às vezes não é tão visível, não é tão concreto, não é tão palpável, como, por exemplo, uma construção de um equipamento, a restauração de um teatro... Como é que você enxerga essa mudança de realidade de vida na sociedade?

Luiz Gastão Bittencourt: Eu diria que talvez ela passa desapercebido em alguns momentos, mas é fantástico quantas vezes você participa. Às vezes, minha esposa vai ao cabeleireiro e, no cabeleireiro, a pessoa fala, dá os parabéns pela gestão do Sistema, porque ou uma filha está estudando numa escola do Sesc, ou porque ela própria fez um curso no Senac, então isso é muito maior do que aparenta. Nós não conseguimos, e ainda estamos na luta com isso, de nos comunicar com a sociedade e podemos mensurar quantas vidas e quantas pessoas são efetivamente transformadas com essas ações.

Eu fico imaginando como seria sem uma Federação do Comércio, sem um Sesc e sem um Senac, como seria esse Brasil. Já ouvi inclusive, de um grande artista plástico, Carlos Vergara, que esteve em Fortaleza, uma vez ele me disse: pra mi, o Sesc é um outro país, porque tudo funciona, imagina o SESC, se não impulsionasse, se não descobrisse os talentos, a cultura do nosso país, se não cuidasse disso. E aqui no Ceará, acho que isso foi muito bem cuidado. Quando a gente vê programas como Povos do Mar, como a Mostra Sesc Cariri, que resgata a cultura dos mestres, valoriza os mestres artesãos. Qual é a tua assinatura nessa gestão?

Luiz Gastão Bittencourt: Eu sempre busquei dar uma ênfase muito grande à educação nas duas casas, tanto numa quanto na outra. E nós nos preparamos, até pra fazer com reservas, e com a austeridade na gestão, para podermos concluir alguns projetos que ainda estão em andamento, e que vão ser concluídos agora, o Maurício também tem conduzido e tem colocado. Um é a unidade do Senac na Desembargador Moreira, que vai ser uma das mais modernas do Brasil, com tudo que foi aprendido, experimentado, durante esse período, e está continuando com relação a isso. Outro é a questão da escola que nós estamos reconstruindo e ampliando a escola da João Bosco, ali chegando até a 9ª série e, hoje nós temos vários alunos que iniciaram na pré-escola no Sesc, terminaram o fundamental na 9ª série do Sesc, passaram para a ESEM do Rio de Janeiro, passaram três anos estudando o ESEM do Rio de Janeiro e se formaram na ESEM do Sesc, então tem toda uma formação de vida dentro das instituições. Eu digo que nós somos a maior rede de proteção social que existe.

É porque imagina, o governo, o Brasil, é tão amplo, grande que é, geograficamente, e o governo não consegue sozinho atender. A gente vê que precisa realmente ter braço, e a Fecomércio articula muito bem. Eu vi muito assim na sua gestão tanto você, quanto Regina, quanto Ana Cláudia, a articulação público-privado, ninguém trabalha sozinho.

Luiz Gastão Bittencourt: Não, um dos grandes trunfos da nossa gestão foi fazermos parceria com todos. Tanto com prefeitura, independentemente de cor partidária, porque a fome não tem cor partidária, a necessidade de atendimento social não tem cor partidária. Existe sim uma grande solidariedade e um processo de que você tem que usar as instituições, as ações para o bem e para construir algo melhor, então você sempre fica naquele processo. Fizemos muito, poderíamos fazer um pouco mais, podemos chegar além, podemos fazer melhor, e isso nós estamos buscando fazer, e o Maurício está dando continuidade. Nós estamos buscando otimizar os custos, diminuindo a parte meio, unificando a gestão da parte meio, para sobrar mais dinheiro para poder atuar mais nas pontas, para poder atender mais pessoas, pra poder levar mais gente até esses atendimentos.

Ontem é o IGBE divulgou, não sei se você, deve ter, lógico, acompanhado, a taxa de desemprego que aumentou neste último trimestre comparada a do ano passado que foi de 12,4 a 12,7. O desafio hoje com certeza é muito maior do que 20 anos atrás, mas o sistema Fecomércio você acredita que está pronto, preparado para o futuro.

Luiz Gastão Bittencourt: Olha, nós estamos nos preparando sempre, eu acho que o aprendizado... Eu, por mais que tenha 20 anos sistema, eu estou aprendendo um pouco mais e tenho aprendido muito. Hoje, na confederação, eu estou condenando as câmaras setoriais, então, nós estamos discutindo com o setor de gêneros alimentícios, estamos vendo a formação necessária para o setor. E isso está sendo levado para o Senac nacional e para os Senacs regionais, para nós redirecionados. Então hoje nós estamos avançando e chegando mais próximo ao empresariado, para termos outros eixos tecnológicos aqui no Ceará. Nós vamos iniciar, pela primeira vez no Brasil, a área de segurança. Então nós vamos lançar o eixo tecnológico de segurança aqui no Ceará, vai ser o primeiro SENAC do Brasil dando cursos de segurança. Então você não para e é uma necessidade permanente de você estar acompanhando o mercado, essas novas profissões. Nós tivemos algumas discussões no Rio de Janeiro, estamos discutindo essa questão também dos programadores de jogos e desses jogos que estão virando uma coqueluche dentro de outros setores, e está abrindo várias oportunidades de emprego nesta área. E um próprio e-commerce, a própria relação comercial via compras eletrônicas e tudo, também tem mudado muito essa posição, então nós estamos num mundo que está se transformando. E as instituições têm que se transformar junto com isso, sem perder a sua finalidade, a natureza pela qual foram criadas, mas nós precisamos, não só as instituições, mas o Brasil como um todo, até para atacar essa questão do desemprego, termos regras claras de quem investe e de como se suporta.

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