Tecnologia

Por Helton Simões Gomes, G1 — San Francisco (EUA) – O jornalista viajou a convite da GSMA


Se máquinas a vapor movidas a carvão deram a partida na primeira revolução industrial, seria o ciberespaço o motor da quarta edição de uma nova reviravolta nos meios de produção?

Empresários e economistas ouvidos pelo G1 defendem que a Quarta Revolução Industrial será movida pela internet ultrarrápida. Ela não encontrará barreiras entre os mundos físico e digital para promover "conversas" entre máquinas, que executarão tarefas cada vez mais sofisticadas.

E esta quarta revolução se apoia nos seguintes pontos:

A combinação destes elementos está no seguinte exemplo: a resposta super-rápida do 5G vai permitir que carros que se dirigem sozinhos se comuniquem com veículos conectados e decidam o que fazer (frear, acelerar, reduzir, ultrapassar ou evitar uma colisão).

Mas como chegamos até aqui?

Klaus Schwab, fundador do Fórum Econômico Mundial (FEM), descreveu em artigo publicado na “Foreign Affairs”:

  • A 1ª revolução industrial usou água e vapor para mecanizar a produção entre o meio do século XVIII e o meio do século XIX
  • A 2ª usou a eletricidade para criar produção em massa a partir do meio do século XIX
  • A 3ª usou os eletrônicos e a tecnologia da informação para automatizar a produção na segunda metade do século XX
  • Agora, no século XXI, a 4ª revolução industrial é caracterizada pela fusão de tecnologias que estão borrando as linhas entre as esferas física, digital e biológica

"Ela é caracterizada pela internet móvel cada vez mais presente em todo lugar, por sensores menores que ficam mais baratos e pela inteligência artificial e aprendizado de máquina", afirma ele, no livro "Quarta Revolução Industrial".

Infográfico com as características da 1ª revolução industrial — Foto: Fernanda Garrafiel/G1

Infográfico mostra as características da 2ª Revolução Industrial — Foto: Fernanda Garrafiel/G1

Infográfico mostra as características da 3ª Revolução Industrial — Foto: Fernanda Garrafiel/G1

Infográfico mostra as características da 4ª Revolução Industrial — Foto: Fernanda Garrafiel/G1

Tem mais máquina na internet do que gente

Segundo a Gartner, até o fim de 2017 eram 8,4 bilhões de dispositivos online, volume 31% maior que em 2016. A conta é conservadora, se comparada à estimativa de outra consultoria, a IDC, que aponta 14,9 bilhões de aparelhos conectados.

Até 2025, o número deve chegar a 82 bilhões. E não estamos falando de smartphones e notebooks. São máquinas usadas em consultórios médicos, geradoras de energia, no transporte, entre outras. Só na Verizon, maior operadora de telecomunicação dos EUA, as conexões da chamada internet das coisas em fábricas cresceram 84% em 2017.

“No século 20, a quarta revolução industrial irá borrar as linhas entre o que é físico e digital. Tudo que pode ser conectado será conectado. Alguns chamam de era ciberfísica”, explicou Ronan Dunne, presidente da Verizon, no Mobile World Congress , nos EUA.

Mas como as máquinas são conectadas? Elas usam um chip de celular, aquele mesmo do seu smartphone. E nem as máquinas antigas, que não comportam um SIM card, estão livres de serem conectadas.

A Siemens, maior fornecedora de automação industrial do mundo, criou um aparelhinho que é plugado a trambolhos industriais offline para colocá-los online, da mesma forma que o Chromecast faz com que TVs "burras" virem “smart”.

Mas, calma, isso é só pontapé inicial...

Para a empresa alemã, essa revolução pode até passar pelas máquinas, mas começa mesmo no ciberespaço. A aposta da empresa é que as aplicações para a indústria podem se tornar tão pop quanto os apps.

Por isso, ela criou o Mindsphere, uma plataforma que abriga diversos serviços para intermediar a conversa entre máquinas, como:

  • Softwares que recebem dados de máquinas para avaliar quando precisaram de reparo
  • Sistemas que reproduzem no mundo virtual uma espécie de irmão gêmeo do maquinário instalado em uma indústria

Assim, é possível fazer simulações de quais mudanças podem aumentar a produtividade ou reduzir problemas. E essa tecnologia vem para ajudar a indústria, mas também para outros segmentos, como o agronegócio.

“Um aplicativo determina pela coloração da folha do melão se a plantação está pronta para ser colhida ou se precisa de mais nutrientes”, diz Murilo Morais, especialista em tecnologias digitais para indústria da Siemens.

Instaladas em drones ou tratores, câmeras vão coletando dados enquanto os veículos passeiam pela plantação. Depois, enviam para uma central inteligente que processa as informações.

“Quarta revolução industrial é algo além de máquinas conversarem. Desde o nascimento do produto, no ambiente virtual. É criar um produto e simular tudo que ele pode sofrer: calor, atrito. Depois, pensar como a produção vai trabalhar, se com robôs, humanos... É pensar a criação de tudo no ambiente virtual, antes de construir a fábrica”, afirma Morais.

“A história completa da digitalização começa antes mesmo do nascimento do produto, porque ele pode nem vir a existir se eu já simulei e vi que não vai dar certo daquela forma.”

Realidade virtual para montar carros

A indústria automobilística já aderiu. Os designers da Ford já usam os óculos de realidade aumentada e virtual da Microsoft para modificar carros, caminhões e SUVs.

Com os HoloLens no rosto, eles podem ver as modificações projetadas sobre um veículo existentes. Isso pode reduzir o emprego de modelos de argila na confecção de novos carros.

A montagem dos automóveis já é uma das cadeias mais automatizadas. A fábrica da Fiat Chrysler em Pernambuco, por exemplo, usa 700 robôs.

A novidade da planta é uma estação com 18 robôs, capaz de aplicar até cem pontos de solda em um minuto. A carroceria dos veículos é montada lá.

A combinação de esteira, braços robóticos e outras máquinas foi feita para ser possível reconfigurar tudo para produzir até quatro modelos de carros.

O 5G vem aí...

Hoje, os robôs já ganharam um canal próprio de comunicação pela internet. Mas o prognóstico é que a chegada do 5G vai acelerar a conexão das máquinas, porque vai oferecer maior liberdade para diferentes tipos de aplicação.

“Para mim, o 5G vai mudar o jogo. A quinta geração de tecnologia sem fio não é só mais uma decoração entre as inovações. 5G tem o potencial de se tornar uma roupagem exclusiva, um punhado de tecnologias que transformam indústrias de todos os setores da economia”, diz Ronan Dunne, presidente da Verizon.

Os padrões do 5G não foram totalmente estabelecidos, mas ele terá:

  • Menor demora da conexão
  • Altas velocidades de tráfego
  • Conectividade constante

"Pense em inovações como a prensa, a máquina a vapor, as ferrovias, eletricidade e a internet. Economistas têm um nome para isso, tecnologias de propósitos gerais. O 5G tem o potencial para ser uma delas. E é uma tecnologia indispensável para disseminar a inovação em uma escala realmente global."

E como fica o trabalho nisso tudo?

Quase dois terços das crianças que ingressam no ensino primário irão trabalhar em empregos que não existem hoje, aponta o estudo “Futuro do Trabalho”, publicado pelo FEM em 2016.

Até 2020, serão 7,1 milhões de postos de trabalho perdidos. Na conta, estão trabalhadores braçais, mas o estudo aponta que dois terços dos cortes atingirão funções "de escritório".

No primeiro caso, a automação exerce um papel fundamental, no segundo, entra cena a inteligência artificial “que tornam possível automatizar tarefas de trabalhadores com conhecimento”. Devem ser atingidos cargos nas áreas de educação, treinamento, direito e operações financeiras.

“A inteligência artificial vai tomar conta do mundo e engolir todos os empregos. Mas podemos relaxar, pois isso vai demorar pelo menos 10 anos”, diz Danny Lange, vice-presidente de inteligência da Unity e que já liderou as máquinas pensantes na Amazon e Microsoft.

Os entrevistados pelo estudo do FEM vão na mesma linha. Apostam que, até 2020, os vários sistemas de inteligência artificial não serão tão onipresentes para impactar radicalmente os índices de desemprego. Mas, quando isso acontecer, o resto será estatística. Por outro lado, novas vagas surgirão na área de internet móvel, internet das coisas, robótica e análise de dados.

E o Brasil?

No Brasil, são poucas as indústrias que integram todas suas áreas com tecnologia e já estão na onda da Quarta Revolução Industrial. Segundo estudo da Confederação Nacional da Indústria (CNI), só 1,6% se vê nesse patamar. Ou seja, usam:

  • meios conectados de acompanhar pedidos feitos a fornecedores;
  • sistemas virtuais para criar ou modelar novos produtos ou novos processos;
  • produção automatizada por máquinas que "conversam" entre si;
  • tecnologias que monitoram produtos usados por um cliente e a forma como ele se relaciona;
  • gestão do negócio usando Inteligência Artificial e análise de Big Data.

Mas a tendência também vai chegar por aqui. Das 759 grandes e médias empresas ouvidas pela CNI, 21,8% preveem que em 10 anos já funcionarão com esse nível de conectividade.

O caminho até lá será longo, já que hoje quase 80% das indústrias brasileiras ainda engatinham: usam tecnologia pontualmente para integrar áreas da empresa de forma parcial.

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