BRASÍLIA — Se as
conversas vazadas
do ex-juiz e atual ministro da Justiça,
Sergio Moro
, envolvessem um parlamentar, o político já estaria preso ou cassado. A dura avaliação foi feita na noite desta segunda-feira pelo presidente do Senado,
Davi Alcolumbre
(DEM-AP), durante evento organizado pelo site Poder 360. Embora tenha feito a ressalva de que é preciso saber
se as conversas divulgadas pelo site The Intercept
são mesmos verdadeiras, Alcolumbre afirmou que, no caso de um parlamentar, isso nem seria levado em conta, porque o conteúdo "é grave".
Segundo o presidente do Senado, Moro teria ultrapassado o limite da ética que regula as relações entre um juiz e as partes do processo. Conversas por intermédio de um aplicativo de celular atribuídas ao ex-juiz da 13ª Vara Federal em Curitiba e o procurador da Lava-Jato Deltan Dallagnol revelaram supostas combinações sobre a condução da operação. Alcolumbre destacou que as pessoas "têm o direito" de conversas, mas "no limite da Constituição".
— Do ponto de vista ético, ultrapassou. Porque o juiz não pode conversar com o procurador. Se aquilo ali for tudo verdade, esse é o problema — disse Alcolumbre. — Aquela conversa não era para ter sido naquele nível entre o acusador e o julgador. (Se verdadeiras) são graves, muito graves. Se isso for verdade, se comprovar que é verdade, vai ter um impacto grande. Não em relação à operação (Lava-Jato), ninguém contesta isso nunca, mas em relação a procedimentos. De maneira procedimental, isso não é coisa boa para um julgador. Na política, se fosse com deputado ou senador, tava no Conselho de Ética, tava cassado ou tava preso. E não precisava nem provar se era com hacker, se era legal.
O presidente do Senado disse que não sabe dizer se o conteúdo das conversas pode ser usado para anular os processos da Lava-Jato. Moro contesta a autenticidade dos diálogos e defende não haver infrações nos textos divulgados. Ele atribui os vazamentos a um "ataque orquestrado" contra a operação contra a corrupção.
— Não sei se pode anular, como vai anular uma operação dessas — disse Alcolumbre.
O presidente do Senado destacou ainda que não seria o caso de usar o episódio de Moro para abrir uma CPI porque o Congresso deve ter outras prioridades.
— Do mesmo jeito que falei da CPI do Judiciário, falei da CPI do Moro. Não precisa disso, vamos cuidar da reforma. Do jeito que o Brasil não merece CPI do Lava Toga, não merece isso, não vai colaborar com o Brasil. Não é bom para o Brasil mesmo. Isso não vai ajudar na política. Vamos fazer o que tem que fazer para o bem.
A reportagem indica que Moro e Dallagnol combinaram atuações na Operação Lava-Jato. Em uma das conversas pelo aplicativo Telegran, Moro cobra agilidade da força-tarefa. “Não é muito tempo sem operação?”, questionou.
Dúvidas sobre condenação de Lula no caso tríplex
A reportagem cita ainda mensagens que sugerem dúvidas dos procuradores sobre as provas para pedir a condenação de Lula no caso do tríplex do Guarujá, poucos dias antes da apresentação da denúncia.
Indignação sobre entrevista de Lula antes da eleição
Na série de três reportagens divulgada pelo site, procuradores da força-tarefa também mostraram indignação com a autorização para a "Folha de S. Paulo" entrevistar o ex-presidente Lula na prisão dias antes da eleição presidencial de 2018.
Moro não vê anormalidade em diálogos divulgados
Em nota após a divulgação dos diálogos, Moro diz que não viu anormalidade em conteúdo: "Quanto ao conteúdo das mensagens que me citam, não se vislumbra qualquer anormalidade ou direcionamento da atuação enquanto magistrado, apesar de terem sido retiradas de contexto e do sensacionalismo das matérias, que ignoram o gigantesco esquema de corrupção revelado pela Operação Lava-Jato"
Procuradores dizem que hacker praticou 'graves ataques'
A força-tarefa de Curitiba rebateu a reportagem, dizendo que "seus membros foram vítimas de ação criminosa de um hacker que praticou os mais graves ataques à atividade do Ministério Público, à vida privada e à segurança de seus integrantes". Um dia após a publicação, o grupo de procuradores afirmou, em nova nota, que "apenas oferece acusações quando há provas consistentes dos crimes".
Novos diálogos: 'In Fux We Trust'
Três dias após a divulgação das primeiras conversas, o Intercept divulgou novos diálogos. Neles,
Dallagnol
afirmou a
Moro
que havia
ouvido de Fux um apoio à Operação Lava-Jato
. Moro, então, teria respondido com a frase em inglês "In Fux We Trust" ("Em Fux nós confiamos").
Em nova nota, Moro diz que cometeu 'descuido formal'
Em novo posicionamento, , Moro
disse que cometeu um "descuido formal"
ao repassar, via Telegram, informação ao procurador Deltan Dallagnol, em meio às investigações da Lava-Jato: "No que se refere a algumas mensagens que podem ser autênticas. Eu não tenho como confirmar isso em 100%".
'O que ele fez (contra a corrupção) não tem preço', defende Bolsonaro
Em entrevista ao jornal "O Estado de S. Paulo", Moro negou a existência de um "conluio" com a força-tarefa da Lava-Jato, afirmou que não há risco de ser anulado o processo do tríplex do Guarujá (SP), no qual o ex-presidente Lula foi condenado e declarou que não vai se afastar do cargo.
Em café da manhã com jornalistas, na sexta-feira posterior ao vazamento das conversas, Jair Bolsonaro disse que a saída de Moro do governo
não foi cogitada
"em nenhum momento"
Em novos trechos, Moro teria sugerido ao MPF nota para rebater Lula
Novas conversas apontam que o então juiz do caso teria sugerido aos integrantes do MPF emitir uma nota rebatendo a defesa de
Lula
, após o interrogatório do petista feito por Moro, em 10 de maio de 2017. A nota acabou sendo divulgada pela força-tarefa, mas com foco diferente do sugerido por Moro
'A defesa já fez o showzinho dela', disse Moro a Carlos Fernando
Em conversa de Moro com o procurador Carlos Fernando dos Santos Lima, o então juiz afirma que os procuradores poderiam apontar as contradições do ex-presidente: "Talvez vocês devessem amanhã editar uma nota esclarecendo as contradições do depoimento com o resto das provas ou com o depoimento anterior dele. Porque a Defesa já fez o showzinho dela", diz a mensagem.
'Podem ter sido adulteradas e editadas', diz Moro em nota
O ministério da Justiça disse em nova nota que não comentará supostas mensagens de autoridades públicas colhidas por meio de invasão criminosa de hackers e que podem ter sido adulteradas e editadas, especialmente sem análise prévia de autoridade independente que possa certificar a sua integridade.
Carlos Fernando desconhece mensagens
Em nota, Santos Lima disse ao GLOBO que desconhece as mensagens citadas pela reportagem: "Desconheço completamente as mensagens citadas, supostamente obtidas por meio reconhecidamente criminoso, acreditando singular que o "órgão jornalístico" volte-se agora contra mim".
— Se eu ficar ligando pra negócio Twitter, não vou ter tempo de trabalhar. Inclusive, se cancelar uns cinco pacotes de dados de Twitter na República a gente vai bem. Não precisa de muito, só uns cinco e o Brasil vai andar — disse ele, sobre a relação entre os Poderes.
Decreto das armas
Durante o evento organizado pelo Poder 360, o senador revelou ainda que chegou a propor ao governo alternativas ao texto do decreto das armas na tentativa de evitar que o texto fosse revogado pelos senadores,
como acabou ocorrendo
. Segundo Alcolumbre, o governo não aceitou alterações no decreto.
— Eu sou da Amazônia, o cara lá precisa de arma para comer e para defender sua família de uma onça. Sei de lugares que a onça passa no quintal da casa do cara. Então o cara quer ter a posse. Trabalhei e as testemunhas são Flávio Bolsonaro e o Marcos Rogerio. Estava pronto para votar um destaque (ao texto) protegendo atiradores, colecionadores, (garantindo) a posse e não o porte. (Estava) ponto um texto construído com todo mundo. Foram procurar o governo e o governo disse que não queria fazer acordo. Se tivesse votado o destaque, todo mundo votava porque corrigia as distorções.