Nepotismo na Administração Pública

16/05/2017 às 18:21
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Estudo realizado para nortear as contratações públicas de pessoal (cargos em comissão), a fim de evitar e coibir a prática de nepotismo no âmbito da administração municipal.

PARECER JURÍDICO

ASSUNTO: HIPÓTESES DE CONFIGURAÇÃO DO NEPOTISMO E BREVE ESTUDO DA MATÉRIA. APLICAÇÃO DA SÚMULA VINCULANTE Nº 13 E LEITURA DO DISPOSITIVO À LUZ DA JURISPRUDÊNCIA MAIS ATUAL E DO POSICIONAMENTO DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO PATRIMÔNIO PÚBLICO DA REGIÃO. NOMEAÇÃO DE FAMILIARES QUE SE RESTRINGE SOMENTE AOS CARGOS DE AGENTES POLÍTICOS. 


I – RELATÓRIO.

1.         Trata-se de expediente encaminhado pelo Prefeito Municipal, no qual é questionada a Assessoria Jurídica quanto ao posicionamento referente a hipóteses de nepotismo no âmbito dos cargos em comissão do Poder Executivo Municipal.

2.         Honrado com a consulta, foi estudada a matéria, para formação do entendimento jurídico aplicável ao acesso de cargos públicos, bem como para esclarecer hipóteses, a priori, de nepotismo.

3.         Para melhor compreensão foi adotada a metodologia da pesquisa exploratória, contemplando a legislação brasileira, princípios, doutrina e jurisprudência sobre nepotismo. Após foi realizada leitura analítica e a formação de juízo para a interpretação crítica esposada na conclusão.

4.         É o relatório, passo a opinar.


II – FUNDAMENTAÇÃO.

II.I – DEFINIÇÃO DE NEPOTISMO, ASPECTOS GERAIS, HISTÓRICOS E CULTURAIS.

5.         A palavra ‘nepotismo’ deriva de nepos (do latim que significa neto ou descendente) + ismós (do grego que tem significado abrangente, servindo de sufixo geral formador de ações), portanto poderia se associar, de forma bastante geral, nepotismo ao ato de apadrinhar ou favorecer a um parente em detrimento de outras pessoas, por vezes com melhores qualificações para determinada atividade ou posição social.

6.         Entendo, nesse sentido, que o nepotismo não é uma prática afeta tão só à política, mas também se reproduz em outros seguimentos da sociedade, como por exemplo o cardeal-sobrinho ou cardinalis nepos em latim, ou ainda, prince de fortune em francês, sobrinho do Papa, que só por isso ocupava um cargo eclesiástico.

7.         A origem do nepotismo no Brasil, sob o aspecto das trocas de favores e interesses, remonta à chegada dos portugueses no próprio descobrimento, onde Carta de Pero Vaz de Caminha registra a tentativa de seu subscritor, após descrever as belezas e riquezas da nova terra, de conquistar um cargo para o seu genro, como pedido final ao rei.

8.         Após isso, com a chegada dos primeiros “prestadores de serviços do Reino de Portugal, boa parte formada de detentores de cargos honoríficos, de confiança e outras nomenclaturas para denominas a escolha dos enviados, muitos dos quais membros da mesma família dos responsáveis por tais nomeações e escolhas”, deu-se a continuidade do nepotismo em solo pátrio. (D’Angelo, 2011, p. 371)

9.         Com o passar do tempo, foi se consolidando o Reino de Portugal no Brasil e com a nobreza aqui instituída, foram se tornando cada vez mais entrelaçados os interesses do reino e os interesses particulares dando abertura a todo e qualquer tipo possível de apadrinhamento e favorecimentos, sempre trazendo prejuízos às pessoas e aos ditos ‘inimigos do reino’.

10.      Óbvio que, com a necessidade de estruturação e aprimoramento dos serviços públicos, notadamente pela formação do Estado brasileiro, houve a necessidade de manter e costurar os favorecidos na malha do funcionalismo, seja para sobrevivência da nobreza, seja para manutenção da aristocracia.

11.      Nesse sentido, o nepotismo tornou-se uma prática comum e perniciosa à medida que mantém dentro da estrutura pública pessoas tão somente por afeição e favorecimento, pondo em último plano a qualificação para o trabalho, a eficiência e tantos outros atributos que merecem observância quando do trato da res pública.

12.      Eduardo Bueno apud D’Angelo (2011, p. 374), traz entendimento de que o nepotismo acaba por arrebatar de forma vil as funções administrativas, desvirtuando o interesse público e figurando em verdadeira perpetuação do interesse particular:

“Com o passar dos anos, desembargadores, juízes, ouvidores, escrivães, meirinho, cobradores de impostos, vedores, almoxarifes, administradores e burocratas em geral – os chamados ‘letrados’ – encontravam-se em posição sólida o bastante para instituir uma espécie de poder paralelo, um ‘quase Estado’ que, de certo modo, conseguiria arrebatar das mãos do rei as funções administrativas. Esse funcionalismo tratou de articular também fórmulas legais e informais para se transformar em grupo autoperpetuador, na medida em que os cargos eram passados de pai para filho, ou então para parentes e amigos próximos.”

13.      Passado o tempo, culturalmente, no Brasil essa defesa do poder pelo poder, onde aqueles que estão em posição de destaque não querem perde-la e não admitem dividi-la com outros que não sejam do seu meio, é o verdadeiro nepotismo e a maior expressão de fórmulas tanto legais, como jurisprudenciais para justificar sua prática.

14.      Notadamente, com o Estado Democrático de Direito, a necessidade latente de mudança desse quadro encontra espaço para aflorar na sociedade.

II.II – APONTAMENTOS FILOSÓFICOS ACERCA DO NEPOTISMO, A ÉTICA E A MORAL DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA ENQUANTO DEVERES SUPRA LEGAIS.

15.      A prática do nepotismo, sem dúvidas acaba por sucatear o desenvolvimento dos serviços públicos, na medida que permite a abertura do acesso aos cargos públicos por critérios que não são o mérito e a competência do indivíduo para exercer uma função junto ao Estado. Nesse sentido, além do prejuízo direto ao serviço prestado pelo Estado, indiretamente, o nepotismo é via de facilitação ao desvio de recursos públicos que poderiam, com eficiência, ser destinados ao cumprimento do interesse público.

16.      Sendo a democracia o regime de governo escolhida para o Brasil, não é presunção concluir que a prática do nepotismo ou mesmo de inserir indivíduos desqualificados nos cargos públicos afronta ao fim preconizado no art. 1º da CF/88, isso porque, em outras palavras, a democracia em suas origens se norteia pela ética e pela moral como condutores ao bom governo.

17.      Dessa forma, cabe a lição de Maria Lúcia de Arruda Aranha e Maria Helena Pires Martins:

“A ‘moral’ é o conjunto de regras e condutas admitidas em determinada época ou por algum grupo de pessoas. Em um primeiro momento dessa discussão, podemos dizer que age bem ou mal na medida em que acata ou transgride as regras morais. A ‘ética’ ou filosofia moral é a parte da filosofia que se ocupa com as reflexão a respeito das noções e princípios que fundamentam a vida moral. Essa reflexão pode seguir as mais diversas direções, dependendo da concepção de ser humano tomada como ponto de partida.” (ARANHA e MARTINS, 2003, p. 301)

18.      A partir disso, muito embora a ética e a moral constituam-se em elementos distintos da política, é inegável que esta última exerce papel fundamental na projeção do caráter de cada indivíduo, bem como aquelas sejam capazes de conduzir os rumos gerais da noção de justiça social e probidade na Administração Pública.

19.      Por óbvio que a ética e a moral exercem papel fundamental na produção das normas, ou seja, a sociedade por meio dos legisladores que exprimem a vontade coletiva, estabelecendo as condutas que são permitidas e também as que são repreendidas.

20.      Dentre as normas, pode-se dizer que há aquelas que são técnicas, que indicam conceitos aplicáveis à realização de fins individuais ou particulares, ostentando a natureza facultativa e normas éticas, que são aquelas que impõem disciplina da relação entre os fins almejados pelo indivíduo e o respeito a bens jurídicos de ordem coletiva, sendo portanto de natureza obrigatória.

21.      Transpassada essa rápida conceituação, tem-se que:

“A prática do nepotismo somente seria aceitável em um sistema não democrático, onde a imposição de valores por determinados detentores do poder atenderia apenas seu interesses e de seus beneficiários, como no clássico ‘A Revolução dos Bichos’ de George Orwell, em que após a assunção dos porcos na administração das atividades da fazenda, restou o mandamento ‘Todos os animais são iguais mas alguns animais são mais iguais que os outros’”. (D’Angelo, 2011,p. 380)

22.      Bem por isso, a ética e a moral aparecem como deveres supra legais, ou seja, acima da norma posta, são de necessária observância no regime democrático, sob pena de não justificar e desvirtuar do motivo de atuação da Administração Pública, ou seja, atuar para a realização do interesse privado, desconsiderando o interesses público.

23.      Também é nesse sentido, que a Constituição Federal no art. 37, caput, fez constar como princípios de amplíssima interpretação positiva, a impessoalidade e a moralidade como norteadores da atuação do Estado.

II.II – O NEPOTISMO NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E A DEFINIÇÃO DE AGENTE PÚBLICO, A IMPLICAÇÃO DA SÚMULA VINCULANTE 13.

24.      Uma vez definido o que vem a ser nepotismo, é oportuno dizer que encontra verdadeira cláusula de barreira não somente sob os aspectos éticos e morais, como também no ordenamento jurídico pátrio.

25.      Inaugura um dos estandartes de combate ao nepotismo, de forma primária, o conceito de acesso aos cargos públicos que deriva do art. 37, II da CF/88, senão vejamos:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

[...]

II - a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração;

26.      Ora, apresenta-se a regra concursal como óbice à nomeação indistinta considerando critérios pessoais e indicativos, com vistas a privilégios, favorecimentos e vantagens. Sobra ainda, sob esse aspecto constitucional, certa reserva de cargos que outorgam ao administrador discricionariedade moderada para livremente nomear cargos em comissão, que não detém estabilidade ao passo que são admissíveis ad nutum, e da mesma forma, exoneráveis.

27.      Consignado esse esboço, há certo corolário de dispositivos normativos que em âmbito federal realizam essa moderação à discricionariedade da nomeação, senão vejamos o Decreto nº 6.906/2009:

Art. 1º - É obrigatória a apresentação de declaração acerca da existência de vínculo matrimonial, de companheirismo ou de parentesco consanguíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o terceiro grau, conforme disposto no Anexo I, com ocupantes de cargos em comissão ou funções de confiança no âmbito do Poder Executivo federal, pelos agentes públicos a seguir indicados, que se encontrem em exercício na data de publicação deste Decreto:

I - Ministro de Estado;

II - ocupante de cargo de natureza especial; e

III - ocupante de cargo do Grupo-Direção e Assessoramento Superiores.

Parágrafo único.  A declaração referida no caput deverá incluir também informação sobre a existência de vínculo matrimonial, de companheirismo ou de parentesco consanguíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o terceiro grau, com estagiário, terceirizado ou consultor contratado por organismo internacional que prestem serviços para o órgão ou entidade da administração pública direta, autárquica ou fundacional onde o agente exerce atividade.

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28.      No mesmo sentido, o Decreto Federal nº 7.203/2010, estabelece vedações nas nomeações e contratações:

Art. 3º - No âmbito de cada órgão e de cada entidade, são vedadas as nomeações, contratações ou designações de familiar de Ministro de Estado, familiar da máxima autoridade administrativa correspondente ou, ainda, familiar de ocupante de cargo em comissão ou função de confiança de direção, chefia ou assessoramento, para:

I - cargo em comissão ou função de confiança;

II - atendimento a necessidade temporária de excepcional interesse público, salvo quando a contratação tiver sido precedida de regular processo seletivo; e

III - estágio, salvo se a contratação for precedida de processo seletivo que assegure o princípio da isonomia entre os concorrentes.

§ 1º - Aplicam-se as vedações deste Decreto também quando existirem circunstâncias caracterizadoras de ajuste para burlar as restrições ao nepotismo, especialmente mediante nomeações ou designações recíprocas, envolvendo órgão ou entidade da administração pública federal.

§ 2º - As vedações deste artigo estendem-se aos familiares do Presidente e do Vice-Presidente da República e, nesta hipótese, abrangem todo o Poder Executivo Federal.

§ 3º - É vedada também a contratação direta, sem licitação, por órgão ou entidade da administração pública federal de pessoa jurídica na qual haja administrador ou sócio com poder de direção, familiar de detentor de cargo em comissão ou função de confiança que atue na área responsável pela demanda ou contratação ou de autoridade a ele hierarquicamente superior no âmbito de cada órgão e de cada entidade.

29.      Ainda, em âmbito nacional, porém, no Poder Judiciário, existe a Resolução nº 04/2005 do CNJ:

Art. 1° É vedada a prática de nepotismo no âmbito de todos os órgãos do Poder Judiciário, sendo nulos os atos assim caracterizados.

Art. 2° Constituem práticas de nepotismo, dentre outras: 

I - o exercício de cargo de provimento em comissão ou de função gratificada, no âmbito da jurisdição de cada Tribunal ou Juízo, por cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, dos respectivos membros ou juízes vinculados;

II - o exercício, em Tribunais ou Juízos diversos, de cargos de provimento em comissão, ou de funções gratificadas, por cônjuges, companheiros ou parentes em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, de dois ou mais magistrados, ou de servidores investidos em cargos de direção ou de assessoramento, em circunstâncias que caracterizem ajuste para burlar a regra do inciso anterior mediante reciprocidade nas nomeações ou designações;

III - o exercício de cargo de provimento em comissão ou de função gratificada, no âmbito da jurisdição de cada Tribunal ou Juízo, por cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, de qualquer servidor investido em cargo de direção ou de assessoramento;

IV - a contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público, de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, dos respectivos membros ou juízes vinculados, bem como de qualquer servidor investido em cargo de direção ou de assessoramento;

V - a contratação, em casos excepcionais de dispensa ou inexigibilidade de licitação, de pessoa jurídica da qual sejam sócios cônjuge, companheiro ou parente em linha reta ou colateral até o terceiro grau, inclusive, dos respectivos membros ou juízes vinculados, ou servidor investido em cargo de direção e de assessoramento.

§ 1° Ficam excepcionadas, nas hipóteses dos incisos I, II e III deste artigo, as nomeações ou designações de servidores ocupantes de cargo de provimento efetivo das carreiras judiciárias, admitidos por concurso público, observada a compatibilidade do grau de escolaridade do cargo de origem, a qualificação profissional do servidor e a complexidade inerente ao cargo em comissão a ser exercido, vedada, em qualquer caso a nomeação ou designação para servir subordinado ao magistrado ou servidor determinante da incompatibilidade.

§ 2° A vedação constante do inciso IV deste artigo não se aplica quando a contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público houver sido precedida de regular processo seletivo, em cumprimento de preceito legal.

Art. 3º É vedada a manutenção, aditamento ou prorrogação de contrato de prestação de serviços com empresa que venha a contratar empregados que sejam cônjuges, companheiros ou parentes em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, de ocupantes de cargos de direção e de assessoramento, de membros ou juízes vinculados ao respectivo Tribunal contratante, devendo tal condição constar expressamente dos editais de licitação.

30.      Ainda que não haja uma legislação municipal que trate a respeito do nepotismo em seus detalhes afetos à cargos, a Lei Orgânica do Município traz acerca de contratos:

Art. 93. O Prefeito, o Vice-Prefeito, os Vereadores e os servidores municipais, bem como as pessoas ligadas a qualquer deles por matrimônio ou parentesco, afim ou consanguíneo, até o segundo grau, ou por adoção, não poderão contratar com o Município, subsistindo a proibição até seis meses após findas as respectivas funções.

31.      Como enunciado de observância geral em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, nos termos do art. 103-A da CR/88, o STF esposou seu entendimento sobre o nepotismo na redação da Súmula Vinculante 13:

A nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de confiança ou, ainda, de função gratificada na administração pública direta e indireta em qualquer dos poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, compreendido o ajuste mediante designações recíprocas, viola a Constituição Federal.

32.      A partir disso, foi firmado entendimento de que determinados cargos de livre nomeação e exoneração não são acessíveis à determinadas pessoas em razão de parentesco consanguíneo ou por afinidade.

33.      Desse modo, imperioso se faz definir o que vem a ser um cargo de comissão e o que é um agente político, onde, valendo-se da lição do professor Marçal Justen Filho:

“A Constituição não adotou disciplina específica para a figura. A expressão ‘agente político’ consta apenas em uma passagem da redação da Constituição. Trata-se do art. 37, XI, que determina que ‘a remuneração e o subsídio dos ocupantes de cargos, funções (...) e dos demais agentes políticos’ não poderão exceder certo limite.

O conceito sob o prisma da função política: Sob um primeiro enfoque, os agentes políticos são aqueles investidos das competências políticas fundamentais, aos quais cabem as decisões mais importantes quanto aos fins e aos meios de atuação estatal, como emanação direta da soberania popular, sendo investidos em mandados por meio de voto popular.” (JUSTEN FILHO, 2015, p. 891)

34.      Portanto, cabe dizer que os cargos e funções públicas são aqueles que não demandam decisões de impacto administrativo, político e financeiros, capazes de qualificar, em si, a atuação do Estado. O que leva a deduzir que cargos em comissão e funções gratificadas têm atribuições internas e organizacionais específicas da condução dos trabalhos e vinculada a determinado seguimento, notadamente hierarquizados de forma direta a no máximo um Secretário Municipal, ou seja, de subordinação indireta ao Chefe do Executivo, pelo que não participam de decisões políticas.

35.      Mais uma vez usando das palavras de Justen Filho, cabe ressaltar a respeito da Súmula Vinculante 13 que:

“O STF adotou a orientação de que a dita súmula se aplica apenas para os cargos administrativos, não incidindo a propósito de cargos e funções políticas.

Ora, o entendimento do STF sobre a questão pressupõe que agentes políticos são não apenas aqueles investidos pelo voto popular. Afinal a discussão sobre o nepotismo envolve a investidura em cargo em comissão ou nomeação para função gratificada – hipóteses que não se aperfeiçoam mediantes voto popular, mas por meio de um ato administrativo. 

A partir dessa orientação, deve-se reputar que a qualidade de agente político deriva não apenas da investidura por meio de sufrágio universal, mas da natureza da atividade desempenhada. Logo, agentes políticos são aqueles que desempenham funções políticas. Pode-se entender que a função política envolve o desempenho de atividades de chefia direta ou indireta das pessoas políticas, traduzindo a formação e a exteriorização da vontade dos entes federativos.

No entanto, a identificação dos cargos políticos aca se fazendo caso a caso, em virtude de controvérsias concretas. Assim, consagrou-se a orientação de que os Ministros de Estado e os Secretários Estaduais e Municipais desempenham função política.” (JUSTEN FILHO, 2015, p. 892)

36.      A jurisprudência muito produziu a partir desse entendimento, como pode ser verificado a seguir, no âmbito do STF:

DIREITO ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL EM RECLAMAÇÃO. NEPOTISMO. SÚMULA VINCULANTE 13.

1. A análise da ocorrência ou não de nepotismo é objetiva, sendo desnecessária a comprovação de efetiva influência familiar na nomeação de ocupante de cargo ou função pública em comissão.

2. Está conforme a Súmula Vinculante 13 Portaria que exonera de função de confiança empregado público concursado em Prefeitura, em razão da existência de parentesco entre ele e ocupante de cargo em comissão no mesmo Município.

3. Agravo regimental ao qual se nega provimento. (Rcl 19911 AgR, Relator(a):  Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em 19/05/2015, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-104 DIVULG 01-06-2015 PUBLIC 02-06-2015)

MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDOR EFETIVO DO PODER EXECUTIVO, QUE EXERCE FUNÇÃO COMISSIONADA EM TRIBUNAL, AO QUAL SEU IRMÃO É VINCULADO COMO JUIZ. CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. SÚMULA VINCULANTE N. 13: NEPOTISMO. MANDADO DE SEGURANÇA DENEGADO.

1. Não se faz necessária comprovação de “vínculo de amizade ou troca de favores” entre o irmão do Impetrante e o Desembargador Federal de quem é assistente processual, pois é a análise objetiva da situação de parentesco entre o servidor e a pessoa nomeada para exercício de cargo em comissão ou de confiança na mesma pessoa jurídica da Administração Pública que configura a situação de nepotismo vedada, originariamente, pela Constituição da República. 2. A configuração de afronta ao princípio da isonomia pressupõe identidade de situações com tratamento diverso, o que, à evidência, não ocorre na espécie.

3. Mandado de segurança denegado. (MS 27945, Relator(a):  Min. CÁRMEN LÚCIA, Segunda Turma, julgado em 26/08/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-171 DIVULG 03-09-2014 PUBLIC 04-09-2014)

Ação direta de inconstitucionalidade. Parágrafo único do art. 1º da Lei nº 13.145/1997 do Estado de Goiás. Criação de exceções ao óbice da prática de atos de nepotismo. Vício material. Ofensa aos princípios da impessoalidade, da eficiência, da igualdade e da moralidade. Procedência da ação.

1. A matéria tratada nesta ação direta de inconstitucionalidade foi objeto de deliberação por este Supremo Tribunal em diversos casos, disso resultando a edição da Súmula Vinculante nº 13.

2. A teor do assentado no julgamento da ADC nº 12/DF, em decorrência direta da aplicação dos princípios da impessoalidade, da eficiência, da igualdade e da moralidade, a cláusula vedadora da prática de nepotismo no seio da Administração Pública, ou de qualquer dos Poderes da República, tem incidência verticalizada e imediata, independentemente de previsão expressa em diploma legislativo. Precedentes. 3. A previsão impugnada, ao permitir (excepcionar), relativamente a cargos em comissão ou funções gratificadas, a nomeação, a admissão ou a permanência de até dois parentes das autoridades mencionadas no caput do art. 1º da Lei estadual nº 13.145/1997 e do cônjuge do chefe do Poder Executivo, além de subverter o intuito moralizador inicial da norma, ofende irremediavelmente a Constituição Federal. 4. Ação julgada procedente. (ADI 3745, Relator(a):  Min. DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 15/05/2013, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-148 DIVULG 31-07-2013 PUBLIC 01-08-2013)

AGRAVO REGIMENTAL EM RECLAMAÇÃO CONSTITUCIONAL. DENEGAÇÃO DE LIMINAR. ATO DECISÓRIO CONTRÁRIO À SÚMULA VINCULANTE 13 DO STF. NEPOTISMO. NOMEAÇÃO PARA O EXERCÍCIO DO CARGO DE CONSELHEIRO DO TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DO PARANÁ. NATUREZA ADMINISTRATIVA DO CARGO. VÍCIOS NO PROCESSO DE ESCOLHA. VOTAÇÃO ABERTA. APARENTE INCOMPATIBILIDADE COM A SISTEMÁTICA DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. PRESENÇA DO FUMUS BONI IURIS E DO PERICULUM IN MORA. LIMINAR DEFERIDA EM PLENÁRIO. AGRAVO PROVIDO. I - A vedação do nepotismo não exige a edição de lei formal para coibir a prática, uma vez que decorre diretamente dos princípios contidos no art. 37, caput, da Constituição Federal.

II - O cargo de Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Paraná reveste-se, à primeira vista, de natureza administrativa, uma vez que exerce a função de auxiliar do Legislativo no controle da Administração Pública.

III - Aparente ocorrência de vícios que maculam o processo de escolha por parte da Assembléia Legislativa paranaense. IV - À luz do princípio da simetria, o processo de escolha de membros do Tribunal de Contas pela Assembléia Legislativa por votação aberta, ofende, a princípio, o art. 52, III, b, da Constituição. V - Presença, na espécie, dos requisitos indispensáveis para o deferimento do pedido liminarmente pleiteado. VI - Agravo regimental provido. (Rcl 6702 MC-AgR, Relator(a):  Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Tribunal Pleno, julgado em 04/03/2009, DJe-079 DIVULG 29-04-2009 PUBLIC 30-04-2009 EMENT VOL-02358-02 PP-00333 RSJADV jun., 2009, p. 31-34 LEXSTF v. 31, n, 364, 2009, p. 139-150)

37.      O STJ, também tem várias construções a respeito do tema:

PROCESSUAL   CIVIL.  AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. CONTRATAÇÃO DE ESPOSA PARA CARGO PÚBLICO. NEPOTISMO. ILEGALIDADE DO ATO.  DOLO GENÉRICO DO AGENTE.  ARTIGO 11 DA LEI 8.429/1992. ENQUADRAMENTO. IMPROBIDADE.

1. O Tribunal de origem, ao decidir a vexata quaestio, consignou (fls.  709/e-STJ):  "Veja-se que o recorrido nomeou a esposa em 01/02/2010 (f.  502) acreditando estar agindo em conformidade com a Lei Municipal n.º 1.048/97 que permitia a contratação de servidores do Município de Rio Brilhante pelo critério capacidade pública e notória (f.  44-45).  Todavia, referida legislação foi revogada em 2007.  Constata-se também que a existência de um projeto de emenda à Lei Orgânica, em dezembro de 2009 (f.  52-53), para permitir a contratação de cônjuge do Prefeito, levou o requerido a acreditar que tal ato tornaria legal a prática do nepotismo. Além disso, as primeiras damas do Município de Rio Brilhante já realizavam o trabalho desempenhado por Iraci Montanha da Silva (f. 55). Ou seja, havia um costume no citado Município e em outros Municípios do interior do Estado o exercício de cargos em comissão pelas primeiras damas.  Ora, havendo a ocorrência do nepotismo, prática reprovável perante a população e sumulada pelo Supremo Tribunal Federal, é mister a apuração das causas da nomeação, as aptidões do nomeado, a razoabilidade da remuneração recebida e a consecução do interesse público. Presentes tais elementos, é possível identificar a possível prática de atos de improbidade." 2. O Ministério Público, por sua vez, ponderou (fls. 773-774/e-STJ): "O simples fato de o Prefeito do Município ter, poucos meses antes da nomeação de sua esposa, apresentado projeto de emenda à Lei Orgânica Municipal, na tentativa de legalizar a contratação da primeira-dama para o cargo em comissão (o que está devidamente assentado pelas instâncias de origem) já evidencia a sua má-fé. Da mesma forma, sua má-fé também se evidencia pelo fato de, tendo sido sua esposa já nomeada, e constatando a ilegalidade decorrente do não preenchimento da exigência de escolaridade (nível superior completo), em vez de exonerá-la imediatamente, optou por encaminhar um projeto de lei para permitir a contratação de pessoal com base em "capacidade pública e notória".

[...]

4. Na hipótese dos  autos, o fato de o Prefeito do Município ter nomeado sua esposa para cargo  em  comissão,  conquanto esta não possuísse o nível de escolaridade exigido em lei, e, posteriormente, sabedor da ilegalidade da nomeação, ter tentado legitimá-la com encaminhamento de  projeto de emenda à Lei Orgânica Municipal, denotam não apenas o nepotismo, como reconhecido pelo Tribunal de origem, mas também o dolo  genérico, configurando-se o ato de improbidade descrito no art. 11 da Lei 8.429/1992.

5. Recurso Especial provido. (REsp 1635464/MS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 13/12/2016, DJe 19/12/2016)

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. NOMEAÇÃO DE PARENTE PARA CARGO EM COMISSÃO. NEPOTISMO. ARTIGO 11 DA LEI 8.429/92. VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. elemento subjetivo. configuração de dolo genérico. PRECEDENTES DO STJ.

1. A hipótese dos autos diz respeito ao ajuizamento de ação civil pública pelo Ministério Público do Estado do Rio Grande do Norte em face da então prefeita do Município de Lagoa D'anta em razão da suposta contratação irregular de parentes e outros servidores para o exercício de cargo público.

2. Em que pese a Corte a quo tenha reconhecido a prática de nepotismo, afastou a ocorrência do ato de improbidade administrativa elencado no artigo 11 da Lei 8429/92, sob o argumento de que não existiu dolo na conduta da então prefeita.

3. Contudo, a Segunda Turma do STJ já se manifestou no sentido de que a nomeação de parentes para ocupar cargos em comissão, mesmo antes da publicação da Súmula Vinculante 13/STF, constitui ato de improbidade administrativa que ofende os princípios da administração pública, nos termos do artigo 11 da Lei 8429/92. Nesse sentido: AgRg no REsp 1362789/MG, 2ª Turma, Rel. Ministro Humberto Martins, DJe 19/05/2015; REsp 1286631/MG, 2ª Turma, Rel. Ministro Castro Meira, DJe 22/08/2013; REsp 1009926/SC, 2ª Turma, Rel. Ministra Eliana Calmon, DJe 10/02/2010.

4. Ademais, o entendimento firmado por esta Corte Superior é de que o dolo que se exige para a configuração de improbidade administrativa é a simples vontade consciente de aderir à conduta, produzindo os resultados vedados pela norma jurídica - ou, ainda, a simples anuência aos resultados contrários ao Direito quando o agente público ou privado deveria saber que a conduta praticada a eles levaria -, sendo despiciendo perquirir acerca de finalidades específicas. 5. Agravo regimental não provido. (AgRg no REsp 1535600/RN, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 03/09/2015, DJe 17/09/2015)

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. NEPOTISMO. PRINCÍPIO DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA. PRINCÍPIO DA IMPESSOALIDADE. VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA-DEFESA. INEXISTÊNCIA. MANUTENÇÃO DA PENA DE CENSURA APLICADA A JUIZ DE DIREITO POR NOMEAR O PAI DE SUA COMPANHEIRA PARA O MÚNUS DE PERITO. ART. 41 DA LOMAN. ART. 125, I E III DO CPC.

1. Hipótese em que Juiz de Direito impetrou, na origem, Mandado de Segurança, objetivando invalidar a pena de censura que lhe foi aplicada pelo Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, por ter nomeado o pai de sua companheira para oficiar em diversas perícias médicas em processos de sua responsabilidade, na Vara onde é Titular.

[...]

6. É certo que a Loman dispõe que o magistrado não pode ser punido ou prejudicado "pelo teor das decisões que proferir" (art. 41), mas implícita nessa norma está a exigência de que essas mesmas decisões não infrinjam os valores primordiais da ordem jurídica e os deveres de conduta impostos ao juiz com o desiderato de assegurar a sua imparcialidade.

7. A Loman não se presta a acobertar, legitimar ou proteger atos judiciais que violem o princípio da moralidade administrativa, o princípio da impessoalidade ou as regras de boa conduta que se esperam do juiz.

8. A independência dos juízes não pode transmudar-se em privilégio para a prática de atos imorais. A garantia é conferida ao Poder Judiciário como instituição, em favor da coletividade, e deve ser por ele mesmo fiscalizada.

9. O fato de os despachos saneadores que nomearam o pai da companheira do recorrente serem de natureza judicial e, na hipótese, não terem recebido impugnação por recurso, em nada impede a abertura de processo disciplinar e, ao final, a punição do infrator.

10. O nepotismo e o compadrio são práticas violadoras dos mais comezinhos fundamentos do Estado Democrático de Direito e, por isso mesmo, exigíveis não só do Executivo e do Legislativo, mas, com maior razão, também do Judiciário.

11. É aberrante a nomeação, pelo juiz, de parente, cônjuge, consanguíneo ou afim, bem como de amigo íntimo, como perito do juízo, comportamento esse que macula a imagem do Poder Judiciário, corrói a sua credibilidade social e viola frontalmente os deveres de "assegurar às partes igualdade de tratamento" e "prevenir ou reprimir qualquer ato contrário à dignidade da justiça" (CPC, art.

125, I e III).

12. Nos termos da Constituição Federal, a união estável é reconhecida como unidade familiar (art. 226, § 3º).

13. Recurso Ordinário não provido. (RMS 15.316/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 01/09/2009, DJe 30/09/2009)

38.      Sem prejuízo, o TJPR também firma seus julgados nesse sentido:

APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA PELA PRÁTICA DE ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA JULGADA PROCEDENTE - VEREADOR - CONTRATAÇÃO DE SOBRINHO COMO ESTAGIÁRIO EM SEU GABINETE - NEPOTISMO - VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA LEGALIDADE, IMPESSOALIDADE E MORALIDADE - AGRAVO RETIDO - CERCEAMENTO DE DEFESA - INDEFERIMENTO DE PROVA TESTEMUNHAL - DESPROVIMENTO - MÉRITO - FATOS INCONTROVERSOS - ART. 128, § 10 DA LEI ORGÂNICA MUNICIPAL - SÚMULA VINCULANTE Nº 13 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL - APLICABILIDADE - ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 12, III, DA LEI Nº 8429/92 - REJEIÇÃO - IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA EVIDENCIADA - ART. 11, I E ART. 12, III, AMBOS DA LEI Nº 8.429/92- PEDIDO DE RESSARCIMENTO AO ERÁRIO - SERVIÇOS DEVIDAMENTE PRESTADOS - RESSARCIMENTO QUE IMPORTARIA EM ENRIQUECIMENTO ILÍCITO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA - PROVIMENTO PARCIAL DO RECURSO. Apelação Cível nº 1.410.421-1 fls. 2 É cediço, a prova a ser produzida destina-se exclusivamente ao convencimento do Julgador e, neste sentido, constando dos autos elementos probatórios hábeis para formar o seu entendimento, possível é o julgamento antecipado, sem que se configure cerceamento de defesa. O art. 128, § 10 da Lei Orgânica do Município de Toledo, em consonância com a Súmula Vinculante nº 13 do Supremo Tribunal Federal e, por analogia, com o Enunciado Administrativo nº 7 do Conselho Nacional de Justiça, aplicáveis ao caso em espécie, vedam a contratação de servidores, parentes até terceiro grau da autoridade contratante e, em desconformidade com o art. 37 da Constituição Federal. Pacífico é o entendimento pela doutrina e pela jurisprudência no sentido de que a Lei de Improbidade Administrativa é Constitucional. É indevido o ressarcimento ao Erário dos valores gastos com contratações irregulares pelo agente público responsável, quando efetivamente houve contraprestação dos serviços, para não se configurar enriquecimento ilícito da Administração. (TJPR - 4ª C.Cível - AC - 1410421-1 - Toledo -  Rel.: Regina Afonso Portes - Unânime -  - J. 24.05.2016)

AÇÃO RESCISÓRIA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. NOMEAÇAO DE SERVIDORES PARENTES DE SECRETÁRIOS MUNICIPAIS. AFRONTA À SÚMULA VINCULANTE Nº 13 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. PROCEDÊNCIA DA AÇÃO DE IMPROBIDADE. AJUIZAMENTO DA AÇÃO RESCISÓRIA COM BASE EM SUPOSTA OFENSA A TEXTO DE LEI (ART. 485, INCISO V, DO CPC). NÃO VERIFICADO. TESE DA RESCISÓRIA DA NÃO CARACTERIZAÇÃO DO NEPOTISMO, PELA INEXISTÊNCIA DE SUBORDINAÇÃO DIRETA ENTRE OS NOMEADOS E OS SECRETÁRIOS MUNICIPAIS, AFASTADA. SÚMULA VINCULANTE Nº 13 NÃO CONDICIONA O NEPOTISMO À SUBORDINAÇÃO DIRETA. INTERPRETAÇÃO NORMATIVA, SEM CARACTERIZAÇÃO DE OFENSA A TEXTO DE LEI. SEM CONDENAÇÃO AOS HONORÁRIOS, POR SER PARTE VENCEDORA O MINISTÉRIO PÚBLICO, POR ANALOGIA AO ENUNCIADO Nº 2 DAS CÂMARAS DE DIREITO PÚBLICO. DEPÓSITO DO ART. 488, II, DO CPC, CONVERTIDO AO RÉU, NOS TERMOS DO ART. 495, DO CPC."(...) Ademais, não seria necessária, para a caracterização de nepotismo, a subordinação funcional ou hierárquica, direta ou indireta, entre os servidores. Além disso, a finalidade do Enunciado seria evitar nomeações diretas ou cruzadas de parentes, as quais presumidamente envolveriam escolhas pessoais em detrimento dos princípios constitucionais da impessoalidade, da moralidade, da publicidade e da eficiência administrativa." (STF - Informativo 796 - TÍTULO - Nomeação de servidor e nepotismo - PROCESSO. Rcl - 18564. Rel. Min. Gilmar Mendes).2. "(...) a sentença que possui interpretação divergente daquela que é estabelecida pela doutrina e pelos tribunais, exatamente pelo fato de que interpretações diversas são plenamente viáveis e lícitas, não abre ensejo para ação rescisória (Súmula 343 do STF)." (in, Marinoni e Arenhart. Manual do Processo do Conhecimento. 5 ed. rev, atual e ampl.São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2006, p.651/652) 3. "(...)Verifica-se, na realidade, a irresignação da parte autora em relação a um provimento jurisdicional que lhe foi desfavorável, fazendo uso do remédio rescisório, típica ação judicial autônoma, como um inadmissível sucedâneo de recurso eventualmente cabível para rediscussão da matéria amplamente debatida no acórdão rescindendo, hipótese de todo vedada pela jurisprudência desta Suprema Corte." (STF - AR 1725 AgR / PE.Rel. Min. CELSO DE MELLO. DJe-221).AÇÃO IMPROCEDENTE, EM JULGAMENTO COM QUÓRUM ESTENDIDO.

(TJPR - 5ª C.Cível - AR - 1363079-2 - Tibagi -  Rel.: Nilson Mizuta - Por maioria -  - J. 26.04.2016)

39.      E a construção jurisprudencial a respeito do nepotismo continua alagando suas fronteiras quanto à abrangência de incidência sobre os cargos públicos, como se vê a seguir:

Agravo regimental na reclamação. Súmula Vinculante nº 13. Ausência de configuração objetiva de nepotismo. Agravo regimental ao qual se nega provimento.

1. Ao editar a Súmula Vinculante nº 13, embora não se tenha pretendido esgotar todas as possibilidades de configuração de nepotismo na Administração Pública, foram erigidos critérios objetivos de conformação, a saber: i) ajuste mediante designações recíprocas, quando inexistente a relação de parentesco entre a autoridade nomeante e o ocupante do cargo de provimento em comissão ou função comissionada; ii) relação de parentesco entre a pessoa nomeada e a autoridade nomeante; iii) relação de parentesco entre a pessoa nomeada e o ocupante de cargo de direção, chefia ou assessoramento a quem estiver subordinada e iv) relação de parentesco entre a pessoa nomeada e a autoridade que exerce ascendência hierárquica ou funcional sobre a autoridade nomeante.

2. A incompatibilidade da prática enunciada na Súmula Vinculante nº 13 com o art. 37, caput, da CF/88 não decorre diretamente da existência de relação de parentesco entre pessoa designada e agente político ou servidor público ocupante de cargo em comissão ou função comissionada, mas da presunção de que a escolha para ocupar cargo de direção, chefia ou assessoramento tenha sido direcionada a pessoa com relação de parentesco com alguém que tenha potencial de interferir no processo de seleção. 3. Agravo regimental não provido. (Rcl 19529 AgR, Relator(a):  Min. DIAS TOFFOLI, Segunda Turma, julgado em 15/03/2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-072 DIVULG 15-04-2016 PUBLIC 18-04-2016)

40.      Tem-se então, conforme a jurisprudência até então analisada, que a ocorrência de nepotismo se dá em relação aos cargos comissionados de direção, chefia, assessoramento e funções gratificadas que possam ser ocupados por indivíduos que ostentam grau de parentesco até o terceiro grau na linha sucessória, seja por vínculo de consanguinidade, seja por vínculo de afinidade, compreendendo, portanto, ouso concluir, os parentescos decorrentes de união estável e ainda resquícios de eventual dissolução do contrato matrimonial, são também objeto de nepotismo.

II.III. NEPOTISMO EM ESPÉCIE.

41.      Tradicionalmente, existem classificações de nepotismo, de onde o nepotismo direto que seria a nomeação do parente para cargo público, tal qual abordado no tópico anterior e as espécies a seguir.

42.      Figura como prática bastante comum no âmbito da Administração Pública brasileira, o nepotismo cruzado, que a contratação, nos moldes anteriores (parentes até o 3º grau) entre os Poderes, abrangendo inclusive o Ministério Público.

43.      Óbvio que a prática do nepotismo cruzado evoluiu da tentativa de ocupantes de cargos públicos com poderes decisivos em se esquivar do nepotismo direto, trocando favores entre si ou simplesmente nomeando parentes de ocupantes de cargos públicos vinculados a um Poder em outro Poder.

44.      Sobre o nepotismo cruzado, aponto a seguir a decisão do STF:

MANDADO DE SEGURANÇA. TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. NEPOSTISMO CRUZADO. ORDEM DENEGADA. Reconhecida a competência do Tribunal de Contas da União para a verificação da legalidade do ato praticado pelo impetrante, nos termos dos artigos 71, VIII e IX da Constituição Federal. Procedimento instaurado no TCU a partir de encaminhamento de autos de procedimento administrativo concluído pelo Ministério Público Federal no Estado do Espírito Santo. No mérito, configurada a prática de nepotismo cruzado, tendo em vista que a assessora nomeada pelo impetrante para exercer cargo em comissão no Tribunal Regional do Trabalho da 17ª Região, sediado em Vitória-ES, é nora do magistrado que nomeou a esposa do impetrante para cargo em comissão no Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região, sediado no Rio de Janeiro-RJ. A nomeação para o cargo de assessor do impetrante é ato formalmente lícito. Contudo, no momento em que é apurada a finalidade contrária ao interesse público, qual seja, uma troca de favores entre membros do Judiciário, o ato deve ser invalidado, por violação ao princípio da moralidade administrativa e por estar caracterizada a sua ilegalidade, por desvio de finalidade. Ordem denegada. Decisão unânime.

(MS 24020, Relator(a):  Min. JOAQUIM BARBOSA, Segunda Turma, julgado em 06/03/2012, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-114 DIVULG 12-06-2012 PUBLIC 13-06-2012)

45.      Há quem defenda que existe a figura do transnepotismo que seria evidenciado com a negociação entre os Poderes, com a ocupação de cargos comissionados por interesses particulares, resultando da nomeação de parentes de um em outro e vice-versa, para o simples fim de driblar a Súmula Vinculante 13. Por exemplo, o vereador da cidade X nomeia como seu assessor o filho do prefeito da cidade Y, que por sua vez, nomeia como assessor de gabinete o sobrinho do vereador da cidade X.

46.      Defendo ainda, a existência do nepotismo econômico ou nepotismo diagonal, que seria a nomeação ainda que por curto espaço de tempo de parentes de sócios de empresas que mantém contratos com a Administração Pública ou a ocupação de cargos ou empregos na empresa privada por parentes de políticos, desde que evidenciado privilégio e a troca de favores e que tenha ocorrido em decorrência da celebração do contrato administrativo.

II.IV – A RECOMENDAÇÃO ADMINISTRATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL

47.      É dever observar que o Ministério Público do Estado do Paraná tornou conhecível o seu entendimento sobre o nepotismo, mediante a Resolução nº 02/2016 do Grupo Especializado na Proteção ao Patrimônio Público e no Combate à Improbidade Administrativa GEPATRIA da região de Santo Antônio da Platina, que assim dispõe:

Expede a seguinte RECOMENDAÇÃO ADMINISTRATIVA ao(à) Excelentíssimo(a) Senhor(a) Prefeito(a) Municipal e Presidente(a) da Câmara de Vereadores, a fim de que:

1 -  no limite de suas atribuições abstenha-se de permitir provimento, por via de nomeação ou contratação, em cargos públicos municipais em comissão e funções de confiança, previstos na legislação municipal, de pessoas que ostentem a condição de cônjuge, companheiro ou parentesco (consanguinidade, afinidade ou civil), até o terceiro grau com o Prefeito Municipal, Vice-Prefeito Municipal, Secretários Municipais, ocupantes de cargos comissionados, Presidentes da Câmara de Vereadores e Vereadores, inclusive na nomeação cruzada (nepotismo cruzado) das pessoas nestas condições.

48.      Portanto, é de fácil dedução que o Ministério Público recomenda a não realização de práticas das quais se possa evidenciar nepotismo.


III - CONCLUSÃO

49.      Diante do exposto, com base na orientação firmada, de forma geral, a respeito da vedação de ocupação de cargos em comissão, funções gratificadas e hipóteses assemelhadas por parentes de autoridades públicas, bem como verificando a incompatibilidade desse tipo de nomeação com os princípios da moralidade, impessoalidade e eficiência (quando o critério de escolha do familiar não alcance condições de capacidade e habilidade técnicas para o serviço público), sem prejuízo do disposto na Súmula Vinculante 13, opino que o nepotismo, até a emissão do presente parecer, somente não alcança aos agentes políticos, ainda que isso contrarie intimamente meu entendimento, já que sequer agentes políticos poderiam se valer do privilégio de ocupar um cargo público tão somente por afinidade e sem a devida e necessária capacidade técnica mínima exigida para tanto.

50.      Assim, os demais casos são passíveis de nepotismo em todas as interpretações possíveis do termo, pois se assim não fosse, a autoridade pública competente para a nomeação de cargos públicos estaria a violar não somente disposições legais, mas antes, também a própria democracia, a ética e a moral no âmbito do Poder Público, nomeando o cônjuge, companheiro ou parente até terceiro grau (em linha reta, colateral ou por afinidade) de forma indistinta e sem levar em conta a necessidade de competência para atuar frente aos serviços públicos.

É o parecer, salvo melhor interpretação. Ressalte-se que o presente Parecer Jurídico foi elaborado tão somente sob o ângulo jurídico e com base nos documentos trazidos a análise, não analisando elementos aprofundados de outras áreas que não a do Direito, bem como critério de conveniência e oportunidade administrativa, escoimando ainda, qualquer responsabilidade de seu signatário conforme o art.2º, § 3º da Lei n. 8.906/94 e entendimento do STJ no RHC: 39644 RJ 2013/0238250-5.


IV - BIBLIOGRAFIA

ARANHA, Maria Lúcia de Arruda. MARTINS, Maria Helena Pires. Filosofando – introdução à filosofia. 3ª ed. São Paulo: Editora Moderna, 2003.

D’ANGELO, Élcio. Direito administrativo municipal e política administrativa. Leme: Anhanguera Editora, 2011.

JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de direito administrativo. 11. ed. rev. atual e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015.

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Sobre o autor
Vinícius Scherch

Graduado em Direito pela Faculdade Cristo Rei, Cornélio Procópio - Paraná (2010). Pós-Graduado em Direito e Processo do Trabalho pela UNOPAR, Campus Bandeirantes - Paraná (2014). Graduado em Gestão Pública pela UNOPAR, Campus Bandeirantes-Paraná (2015). Mestre em Ciência Jurídica pela UENP -Jacarezinho. Advogado na Prefeitura Municipal de Bandeirantes - Paraná.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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