No parquinho, a alegria de Joaquim Amândio e Maria Clara, gêmeos
de 2 anos e meio, e o orgulho da mãe, a psicanalista Carla
Cumiotto Mas quem é a outra mulher? A pergunta está sempre
presente onde quer que a família, que vive em Blumenau, Santa
Catarina, vá.
"Duas senhoras acima de 70 anos me olharam e
perguntaram de quem eles eram. Eu, muito coruja, disse que eram
meus. Uma delas me olhou dos pés à cabeça, se aproximou e disse:
'Você deve ter ficado enorme'. Eu disse que foi minha
companheira que gerou, que eu era casada com uma mulher, que
fizemos inseminação em São Paulo e tivemos os dois. Ela parou e
disse ‘Nossa, que coragem!’", lembra a psicanalista Michele Kamers.
Foi Carla que ficou enorme e radiante. A companheira Michelle
acompanhou cada passo da gravidez. Joaquim Amândio veio
primeiro. Tudo foi registrado em detalhes para mostrar aos
filhos quando crescerem. Depois, veio Maria Clara.
Emoção, encantamento. Uma festa que acontece com
todas as famílias na maternidade. Mas esta foi um pouco
especial. Carla amamentou durante um ano e dois meses. E os
bebês cresceram fortes. As crianças chamam Carla de mamãe e
Michelle de "pami". E ajudaram o casal a se aproximar
mais das próprias famílias. Joaquim e Maria Clara contam que
vovô levou pirulito e frango assado no domingo.
É uma família com uma forma nova, mas ao mesmo
tempo muito tradicional. Alguns amigos até estranham.
"Perguntaram se nós havíamos colocado azul e
rosa nas crianças. Eu levei um susto. Que cor nós colocaríamos?
Como se, ao ser feita essa escolha não tão comum de casamento e
família, tivéssemos que usar cabelos verdes e colocar laranja no
menino. Como se tivesse que ser tudo diferente. Não é essa a
questão. Pelo contrário, queremos ser inseridas nos códigos que
a cultura tem", diz Carla.
Essa vontade de ser como todo mundo fez com que
Michele e Carla buscassem na Justiça algo impensável até pouco
tempo atrás. E conseguiram. Um juiz de Porto Alegre determinou
que as crianças fossem registradas como filhas de duas mulheres.
A justificativa do juiz: o fato de que elas não escondem nada de
ninguém e estão integradas totalmente na sociedade em que vivem.
"Não é novo que haja este casamento. Mas
ainda é novo, no país em que vivemos, que alguém tenha querido
ser família e tornar isso visível", explica Carla.